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Advogado especialista em inventário

 

Como e quando pleitear a nulidade do inventário?

 

Sumário: Resumo. 1. Introdução; 2. Causas e ação para a nulidade do inventário; 3. Do prazo para alegar a nulidade do inventário; 4. Conclusão.

 

Resumo

 

         Importantes questões se perfazem em torno do tema do inventário, seja nas variadas tentativas de um processo menos lento e mais justo, seja pelas discussões que se originam sobre o próprio direito de herança, seja por outros fatores. No informativo ora disposto dar-se-á enfoque na nulidade do inventário ou partilha, explicitando, ainda que breve, assuntos atinentes a sua ação, razão de ser e também do prazo merecedor de atenção, uma vez que decorrido, promove a perda da pretensão (prescrição) ou do próprio direito (decadência).

Com este escopo, inicialmente, será apresentado a distinção entre nulidade e anulabilidade, a fim de que os mais leigos compreendam o que concerne e a principal diferença entre estas, para que, assim, seja possível demonstrar, com base legal, alguma das suas causas e como se dá o seu pleito, bem como o prazo que possui e os debates acerca da sua configuração.

           

1. Introdução

 

O processo de inventário tem o escopo de realizar a individualização dos bens constituintes de herança aos sucessores do de cujus. Sendo instrumento obrigatório e devendo ser realizado em até dois meses após a morte do indivíduo,[1] sob pena de pagamento de multa, nos casos em que o falecido deixa bens, direitos ou deveres (patrimônio).

Entretanto, por diversos fatores que o presente informativo tentará esboçar através de exemplos, o processo de inventário pode ser desenvolvido com algum defeito, podendo, então, ser passível de nulidade ou anulabilidade.

Tendo isso em vista, será abordado, ainda que não se vise o esgotamento do tema, as possíveis causas que geram a nulidade do inventário, bem como qual o instrumento viável para o seu pleito, e, por fim, o prazo atribuído para requerer a análise de nulidade do inventário e partilha.

 

2. Causas e ação para a nulidade do inventário

 

De início, é necessário analisar, ainda que brevemente, a própria ideia de “nulidade”. A nulidade pode ser absoluta ou relativa, o presente informativo vai se concentrar na primeira, pois, sendo declarada a nulidade absoluta do inventário realizado, é como se ele nunca estivesse produzido efeitos jurídicos, devido a sua eficácia ex tunc. Por sua vez, a nulidade relativa corresponde a anulabilidade, também muito comum nos processos de inventário, mas que, em contrapartida, possui uma eficácia ex nunc, pois, deixa de produzir efeitos a partir da sentença que declara a anulabilidade de parte do inventário, por exemplo. Ademais, a nulidade absoluta decorre da ausência de cuidado com elementos essenciais ao negócio ou ato jurídico, ou seja, no processo de inventário, deixa-se de lado questões primordiais que não podem simplesmente ser consertadas como o caso da anulabilidade.

O artigo 166 do Código Civil determina as causas gerais de nulidade dos negócios jurídicos, que também se aplicam, em conformidade com o art. 185, aos atos jurídicos em stricto sensu:

 

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

 

 

         Assim sendo, não é raro encontrarmos decisões de nulidade de inventário oriundo da ausência de declaração de herdeiros, ou seja, um indivíduo se coloca como único herdeiro do de cujus ainda que saiba do conhecimento dos demais (violação dos incisos III e VI do artigo supracitado), de modo que o herdeiro excluído pode suprir o seu direito não assegurado através da ação de nulidade de partilha conjuntamente, inclusive, à petição de herança; dá-se também a nulidade quando inexiste citação do cônjuge, posto que viola o inciso IV do art. 166 mencionado, bem como contraria o art. 626 do Código de Processo Civil[2] ou ainda quando o objeto que constitui a herança é impossível ou ilícito. Observe-se, a título de reforço dos exemplos, as decisões a seguir:

 

APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO DE INVENTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR EM APENSO. SENTENÇA DE HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA. INSURGÊNCIA DO CÔNJUGE. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. ALEGAÇÃO DOS APELADOS DE QUE O COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO DE ADVOGADO NO INVENTÁRIO SURPRE O ATO CITATÓRIO, ASSIM COMO A CITAÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR, EM APENSA. NÃO ACOLHIMENTO. SENTENÇA DE PARTILHA PROFERIDA SEM PRÉVIA CITAÇÃO DA VIÚVA. NULIDADE QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1.Hipótese em que a sentença de partilha foi proferida em procedimento de inventário sem citação da viúva. Apelado que alega que a viúva, ao apresentar resposta na medida cautelar, que tramitou apensa aos autos principais de inventário, tomou ciência inequívoca da demanda principal. 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, não configura o comparecimento espontâneo o peticionamento nos autos por advogado destituído de poderes especiais para receber a citação e sem a apresentação de defesa; e a carga dos autos por advogado sem poderes específicos para receber citação. 3. Impossibilidade de se considerar o comparecimento espontâneo do cônjuge, ora apelante, no procedimento de inventário, embora essa tenha tomado ciência da existência do inventário quando foi citada na medida cautelar. 4. De acordo com previsão expressa do Código de Processo Civil, feitas as primeiras declarações, o juiz mandará citar, para os termos do inventário e da partilha, o cônjuge, sob pena de vulnerar o direito da parte de respeito ao devido processo legal. 5. Sentença de partilha proferida sem prévia citação do cônjuge sobrevivente do de I. para se manifestar no procedimento de inventário. Nulidade que se impõe. 6. Recurso conhecido e provido. (TJPR - 11ª C. Cível - 0006910-85.2009.8.16.0170 - Toledo - Rel.: Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson - J. 04.07.2019). (TJ-PR - APL: 00069108520098160170 PR 0006910-85.2009.8.16.0170 (Acórdão), Relator: Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson, Data de Julgamento: 04/07/2019, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/07/2019)

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE PARTILHA. HERDEIRO NECESSÁRIO PRETERIDO. PRAZO DECENAL. RECURSO PROVIDO. 1. A AÇÃO DE NULIDADE DE INVENTÁRIO/PARTILHA EXTRAJUDICIAL originária tem por objeto a declaração de nulidade absoluta da adjudicação de um imóvel, realizada em virtude do arrolamento extrajudicial em que o requerido/apelado ÂNGELO DE OLIVEIRA COUTINHO omitiu a existência dos outros herdeiros necessários, fazendo-se assim figurar como único sucessor do de cujus e, em consequência, registrando o imóvel em seu nome mesmo existindo um inventário judicial sobre o referido bem, do qual participavam o requerido e os demais herdeiros. 2. A norma referida na sentença, qual seja, o art. 2.027, parágrafo único, do Código Civil, que estabelece o prazo de um ano para anular a partilha, não comporta interpretação no sentido de atingir aquele que não se incluiu no inventário, haja vista a exiguidade do prazo de decadência supramencionado, para poder vindicar sua herança. A contrário sensu, restaria praticamente decretada a impossibilidade de anulação de partilha viciada pela exclusão de herdeiro necessário que dela não participou. 3. O que se busca, então, é a nulidade de negócio jurídico unilateral decorrente da falsa declaração do herdeiro Ângelo de Oliveira Coutinho, que se nominou único herdeiro de Sebastião Ferreira da Silva. 4. É de 10 anos o prazo prescricional para o herdeiro excluído da partilha requerer em juízo a sua nulidade da partilha da qual não participou. 5. A partilha extrajudicial e a respectiva adjudicação do imóvel ocorreram no ano de 2011; a presente ação, por sua vez, foi ajuizada em 08/10/2015, dentro do prazo geral decenal previsto no artigo 205 do Código Civil, o que leva à conclusão de que a sentença que reconheceu a decadência deve ser cassada, possibilitando o prosseguimento da ação anulatória e, em consequência, restabelecendo a ação de restauração de autos nº 5000119-57.2011.827.2718, a ação de prestação de contas nº 0001093-43.2015.827.2718 e a ação de remoção de inventariante nº 0001094-28.2015.827.2718. 6. Recurso de apelação conhecido e PROVIDO para anular as sentenças de primeiro grau e determinar o prosseguimento dos feitos originários. (TJ-TO - AC: 00147614820198270000, Relator: MAYSA VENDRAMINI ROSAL)

 

Em suma, violado qualquer elemento essencial e constituinte do processo de inventário, seja ele ocorrido pela via judicial ou administrativa (extrajudicial), caberá o pleito de nulidade. Porém, a partir disso advém uma nova questão, qual o meio de pleitear a nulidade do inventário ou partilha? Pois bem, a nulidade absoluta, objeto do informativo ora discorrido, pode ser declarada ex officio pelo próprio magistrado ou ser pleiteado em ação própria de declaração de nulidade de inventário; como mencionado anteriormente, em casos decorrentes da omissão de um dos herdeiros, este pode adentrar com petição de herança conjunta à concessão de nulidade da partilha ou inventário realizada. Entretanto, nos casos que concernem à conteúdo componente do próprio decurso do processo poderá ser alegado e seguir discussão na ação existente.

Paralelamente ao exposto, é inevitável o debate sobre o prazo fornecido legalmente para que seja pleiteada a declaração de nulidade do inventário, como será feita no tópico a seguir.

 

3. Do prazo para alegar a nulidade do inventário

 

O prazo para alegar a nulidade do inventário foi um tema bastante conturbado na esfera doutrinária e jurisprudencial, porém, com o passar do tempo, houve certa consolidação na jurisprudência sobre a aplicação do prazo prescricional decenal, ou seja, de 10 (dez) anos, embora seja uma interpretação distinta da propugnada no Código Civil.

Vejamos, o art. 169 do CC expõe que: “O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo”, quer dizer, há o entendimento de que não existe um prazo para a sua alegação, no chamado “princípio da imprescritibilidade do ato nulo”. Entretanto, isso não seria viável, em termos de eficácia, na prática; é só imaginar alguém que alega a nulidade do inventário por não ter sido incluído na partilha depois de 50 anos, por exemplo. Os efeitos desencadeados até este momento seriam mais difíceis de serem considerados inexistentes, bem como se tornaria ainda mais demorado quando pensarmos no tempo de conclusão da partilha pela via judicial. A partir desta premissa e buscando também a conformidade com a legislação, o Judiciário passou a compreender que, tendo em vista a ausência de prazo específico sobre a nulidade no inventário, há a aplicação da disposição geral estabelecido no art. 205 do Código Civil: “A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”. Compreende-se que, diante da ideia de ser um ato imprescritível, é melhor lhe fornecer o maior prazo disposto pelo Código Civil, ainda que a natureza do direito de herança não configure um direito de prestação, mas sim, potestativo.

Em suma, de maneira majoritária se compreende que o pleito de nulidade do inventário pode ser feito 10 anos, variando, conforme o caso, o momento inicial da sua contagem.

 

4. Conclusão

 

Diante de todo o exposto, conclui-se que se deve atentar, antes de tudo, para as diferenças existentes entre a nulidade e a anulabilidade, compreendendo que aquela está relacionada inteiramente aos elementos essenciais (capacidade, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, citação do cônjuge como preceitua o CPC, dentre outros elementos) dos atos jurídicos lícitos em geral. Ao que se refere a ação poderá ser pleiteada autonomamente, em ação declaratória de nulidade de inventário ou ser discutida no mesmo processo, quando se tratar, por exemplo, da sentença de partilha dos bens prolatada sem a citação do cônjuge supérstite. Por fim, muito embora os atos nulos tenham sidos inseridos no Código Civil como imprescritíveis, consoante art. 169, a jurisprudência adotou, por questões de praticidade e maior regulamentação da matéria, a aplicação do prazo decenal (dez anos) contido no art. 205 do CC.

 

[1]Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte.

[2]Art. 626. Feitas as primeiras declarações, o juiz mandará citar, para os termos do inventário e da partilha, o cônjuge, o companheiro, os herdeiros e os legatários e intimar a Fazenda Pública, o Ministério Público, se houver herdeiro incapaz ou ausente, e o testamenteiro, se houver testamento.