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Advogado de Família | Guarda Unilateral e Compartilhada

Autores do artigo:

WINDERSON JASTER, especialista em Direito de Família e Sucessões, Direito Imobiliário e Direito Aplicado na Escola de Magistratura do Estado do Paraná e JOSÉ LUIZ DA MATTA COTA, graduado em Direito na Universidade Federal do Estado do Paraná.

1. INTRODUÇÃO

O término de um relacionamento consubstanciado em casamento ou união estável, por si só, já é causa suficiente para dar ensejo a incontáveis preocupações e inseguranças. A dor de cabeça aumenta ainda mais quando o casal tem filhos provenientes da relação que se encontra em crise.

Não à toa, neste contexto, muitas separações sequer chegam a ser oficializadas. Os envolvidos, algumas vezes, preferem sustentar um casamento infeliz em prol de uma criação dos filhos em um ambiente familiar reunido. Foi este o resultado de uma pesquisa realizada no Reino Unido no ano de 2014, que apontou que 1 (um) em cada 4 (quatro) casais permanecem juntos apenas para que os filhos não passem pela indesejada experiência de lidar com um lar dividido[1].

Independentemente de um posicionamento crítico acerca desta decisão, eis que individual de cada um, necessário se faz desmistificar, no presente estudo, a problemática da guarda do filho após a dissolução do relacionamento.

Isto porque o Direito brasileiro, quando no tocante a este tema, está inteiramente fundado no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Em outras palavras, busca-se a todo tempo a mitigação dos efeitos prejudiciais de uma separação para o filho, prevendo a legislação mecanismos para regular este contexto, inclusive, caso os pais eventualmente não consigam dialogar e chegar a um ponto de interesse comum. Estudaremos, neste sentido, o que são os institutos do poder familiar e da guarda, e como a lei dispõe sobre esta última quando a relação inevitavelmente chega ao fim.

2. DO PODER FAMILIAR E DA GUARDA

Quando se dá a luz a uma criança, temos o inicio não somente de uma vida, mas também de uma relação jurídica entre os pais e o filho. E uma das principais decorrências desta relação de filiação é o dever-poder imposto aos genitores de criar, educar e orientar os menores de dezoito anos, tanto no âmbito existencial quanto patrimonial. A este, os operadores do Direito conferem o nome de “poder familiar” ou, alternativamente, “autoridade parental”.

Trata-se de uma autoridade exercida em relação aos filhos que, nos moldes do que orienta os artigos 1.630 a 1.633 do Código Civil, é atribuída conjuntamente a ambos os pais.

Cabe a eles, neste sentido, “um complexo de normas concernentes aos direitos e deveres dos pais relativamente à pessoa e aos bens dos filhos menores não emancipados[2]”, dentre os quais pertinente se faz destacar o exercício da guarda.

Podemos chegar à fundamental conclusão, portanto, que a guarda se revela como apenas um elemento do poder familiar. Em uma tentativa de defini-la juridicamente, podemos dizer que a guarda regula o estado de fato relativo à posse da criança ou do adolescente, conservando-o sob vigilância e companhia[3].

Fundamental se faz apontar, neste sentido, que a que a guarda deve ser concedida a quem possuir melhor relação de socioafetividade, além de proporcionar as melhores condições de segurança, saúde e educação para o menor[4], sempre em vistas do já mencionado princípio do melhor interesse da criança ou do adolescente.

Ocorre que os menores, até a maioridade, estão sempre sujeitos ao poder familiar de ambos os pais, ainda que inexista ou tenha sido rompida a relação conjugal. A guarda, por sua vez, sendo apenas um de vários elementos do poder familiar, não necessariamente está presente a todos eles e em todos os momentos.

Nos moldes do que muito bem leciona Paulo Nader, “na constância do casamento, a guarda dos filhos é dever inerente ao exercício do poder familiar. Quando a sociedade conjugal se desfaz, permanece o poder familiar, mas um dos ex-consortes perde a guarda, ressalvada a hipótese de compartilhamento[5]”.

Surge, neste momento, um impasse. Com qual dos genitores, ambos possuidores do poder familiar, deve ela ficar?

De início, fundamental se faz remeter às duas possibilidades de divórcio: consensual ou litigiosa.

Ocorrendo ela de forma consensual, as regras sobre a guarda são definidas pelos próprios pais, interessados no melhor para a criança ou o adolescente. Caso cheguem eles a este comum acordo, seus interesses são levados ao juiz para uma simples homologação.

Por sua vez, caso os pais não consigam entrar em um consenso quanto à matéria da guarda – o que se pode considerar normal frente aos abalos emocionais de toda ordem decorrente de um término do relacionamento – será ela definida por ato do juiz, vinculando-a a uma das três principais modalidades estudadas a seguir.




3. DAS MODALIDADES DE GUARDA

3.1. DA GUARDA COMPARTILHADA

É comum que, ao ouvirmos falar sobre a guarda compartilhada, pensemos de imediato se tratar de uma modalidade na qual haveria um compartilhamento físico do menor. Entretanto, não é bem assim. Trata-se ela, em verdade, de uma divisão igualitária e simultânea das responsabilidades e das despesas do menor.

Apenas a título elucidativo, devem ser decididas conjuntamente questões como a mudança de escola, a forma de criação e educação do menor, opções por tratamentos médicos e assim por diante.

Quanto à frequência física do menor, o Código Civil, no parágrafo 2º de seu artigo 1.583, dispõe que “o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos”.

Ocorre que da leitura deste dispositivo, pode-se chegar a uma conclusão equivocada de que o menor deveria dividir igualmente seu tempo entre os respectivos genitores, o que caracterizaria, em verdade, uma guarda alternada – modalidade a ser estudada adiante[6]. Justamente por esta razão, foi aprovada na VII Jornada de Direito Civil, realizada em 2015, o Enunciado nº 604, que estabelece que “a divisão, de forma equilibrada, do tempo de convívio dos filhos com a mãe e com o pai, imposta para a guarda compartilhada pelo § 2.º do art. 1.583 do Código Civil, não deve ser confundida com a imposição do tempo previsto pelo instituto da guarda alternada, pois esta não implica apenas a divisão do tempo de permanência dos filhos com os pais, mas também o exercício exclusivo da guarda pelo genitor que se encontra na companhia do filho”.

Também com base neste mesmo entendimento, pertinente se faz apontar as lições de José Fernando Simão:

Não se pode imaginar que compartilhar a guarda significa que nas duas primeiras semanas do mês a criança dorme na casa paterna e nas duas últimas dorme na casa materna. Compartilhar a guarda significa exclusivamente que a criança terá convívio mais intenso com seu pai (que normalmente fica sem a guarda unilateral) e não apenas nas visitas ocorridas a cada 15 dias nos fins de semana. Assim, o pai deverá levar seu filho à escola durante a semana, poderá com ele almoçar ou jantar em dias específicos, poderá estar com ele em certas manhãs ou tardes para acompanhar seus deveres escolares. Note­-se que há por traz da norma projetada uma grande confusão[7].

Fundamental se faz trazer à tona a discussão referente ao parágrafo 2º do artigo 1.584 do mesmo Código, que, in verbis, assim dispõe: “Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor”.

Ocorre, entretanto, como se pode imaginar, que esta previsão pode em muito ser problemática quando aplicada na realidade. Rolf Madaleno, neste sentido, afirma que não é da índole da guarda compartilhada a disputa litigiosa, típica dos processos impregnados de ódio e de ressentimentos pessoais, quando pensam os pais ser compensados pela decisão judicial. Afinal, a ideia de compartilhamento, em tese, exigiria acordo[8].

Ainda quanto a esta discussão, foi julgado no ano de 2016, pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, o REsp 1.417.868/MG, que manteve a ideia de que a inexistência de consenso entre os cônjuges não impede a guarda compartilhada. Porém, nas palavras dos magistrados,

(...) essa regra cede quando os desentendimentos dos pais ultrapassarem o mero dissenso, podendo resvalar, em razão da imaturidade de ambos e da atenção aos próprios interesses antes dos do menor, em prejuízo de sua formação e saudável desenvolvimento (art. 1.586 do CC/2002). Tratando o direito de família de aspectos que envolvem sentimentos profundos e muitas vezes desarmoniosos, deve­-se cuidar da aplicação das teses ao caso concreto, pois não pode haver solução estanque já que as questões demandam flexibilidade e adequação à hipótese concreta apresentada para solução judicial.[9]

Esclareça-se, finalmente, que a fixação da guarda compartilhada (ou alternada) não gera, por si só, a extinção da obrigação alimentar em relação aos filhos, devendo a fixação dos alimentos sempre ser analisada de acordo com o binômio ou trinômio alimentar[10].




3.2. DA GUARDA UNILATERAL

A segunda modalidade de guarda a ser estudada pelo presente artigo é a chamada guarda unilateral. Em síntese, diz respeito à hipótese em que a guarda é atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua, garantindo-se ao outro o mero direito de visitação.

De acordo com as premissas já estudadas pelo presente artigo e levantadas quando da análise da guarda compartilhada, tem-se que a guarda unilateral constitui exceção à regra, devendo apenas ser escolhida quando não for possível a adoção da guarda compartilhada.

Ressalta-se, entretanto, que o genitor que não detenha a guarda terá o dever de supervisionar os interesses dos filhos, podendo solicitar informações e/ou prestações de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação dos filhos.



3.3. DA GUARDA ALTERNADA



Apesar da omissão legislativa, vez que o artigo 1.584 do Código Civil somente prevê as guardas compartilhada e unilateral, entende-se doutrinariamente e jurisprudencialmente que é possível as modalidades da guarda quando necessário para satisfazer a busca do melhor interesse da criança e do adolescente.

A chamada guarda unilateral, neste sentido, é aquela em que ocorre a fragmentação da vida do menor em períodos. É o caso, por exemplo, das crianças que passam 15 (quinze) dias com o pai e 15 (quinze) dias com a mãe, seguindo-se nesta alternância.

Trata-se de modalidade muito questionada em razão dos riscos de dano ao menor, vez que poderia ter prejuízo aos seus vínculos sociais decorrentes justamente por conta desta alternância. É neste sentido que Flávio Tartuce a denomina “guarda do mochileiro, pois o filho sempre deve arrumar a sua mala ou mochila para ir à outra casa”, complementando seu desaconselhamento a esta modalidade na medida em que a “criança perde seu referencial, eis que recebe tratamentos diferentes quando na casa paterna e na materna”[11].

Inobstante todos estes fatos, como já apresentado, ainda assim pode a guarda alternada ser a modalidade adotada caso seja levado em conta o melhor interesse do menor.


[1] One in four married couples only stay together for their children... and a fifth plan to split after a final family Christmas. Daily Mail. 16 dez. 2014. Disponível em: . Acesso em: 5 set. 2018.

[2] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 5: Direito de Família. 26ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 593.

[3] Abordaremos, no presente estudo, apenas o instituto da guarda disciplinada no Código Civil, entendida como consequência do poder familiar/autoridade parental. Por fins metodológicos, neste sentido, não discorreremos sobre o instituto da guarda enquanto medida de inserção da criança e do adolescente em família substituta, tema inserido Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

[4] FIGUEIREDO, Luciano; FIGUEIREDO, Roberto. Direito Civil: Família e Sucessões. 2ª edição. Salvador: Editora Juspodivm, 2015. p. 483.

[5] NADER, Paulo. Curso de direito civil, v. 5: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 419.